Modelos familiares
Todos somos fruto de uma história familiar, de experiências que tivemos em nossas famílias de origem e na própria cultura, da ideia que temos sobre a vida a dois, advinda da comunidade e de todo o corpo social. Em função de todo um conjunto psicológico - uma combinação de crenças, valores, preconceitos, ideias e condutas aprendidas - que exerce grande influência sobre os modelos de vinculação, que evoluem ao longo do ciclo de vida individual e do ciclo de vida do casal.
O cônjuge vai colocando no parceiro sua história pessoal. Esse pensamento é corroborado por Satir (Apud ANDOLFI; CLAUDIO, SACCU, 1995), ao postular que o casal é composto de três partes, duas pessoas, e uma relação (construída nas interações estabelecidas entre o casal), na qual depositamos um conjunto de desejos e expectativas, o que nos faz ver o outro, através de uma névoa que distorce a realidade.
Bowen (1991), considera que, se não nos diferenciarmos na relação, tendo clareza do que é nosso e do que é do outro, corremos sérios riscos de nos misturarmos no parceiro, podendo gerar confusão e servir de base para conflitos nos relacionamentos.
Buscamos a fusão que experimentamos durante os nove meses de gestação e nos apaixonamos pela nossa própria idealização. Isso perpassa na relação, por meio da linguagem digital (conversas) e analógica (postura corporal, expressão de rosto, olhares, etc). O que a gente vivencia, fica registrado em nossos poros, em nossa memória celular e quando não é olhado, percebido, reconhecido, cuidado e elaborado, se arrasta através das gerações vindouras.
Família de origem
As famílias, nas suas mais diversas configurações, estão em contínua transformação e têm sido foco de interesse em todos os âmbitos das ciências humanas e sociais. Além disso, constituem nossa primeira célula social e são um sistema de forças em que estamos mais ou menos imersos. Cada membro da família, já ao nascer, recebe uma “missão” e com o tempo exerce também uma “função”. Posteriormente, “missão” e “função” se conectam no que chamamos de “legado”. Tanto uma quanto outra, são transmissões psíquicas geracionais, que chegam ao indivíduo de forma inconsciente.
Uma família é composta de três subsistemas: O conjugal, o parental e a fratria. O subsistema conjugal é formado pelo casal (duas culturas), que se juntam e se encontram numa relação e que é fundante de um sistema familiar. Sendo assim, sofre as influências de padrões de funcionamento individuais (regras de relação), ou seja, as regras familiares explícitas e implícitas (subliminares) que cada membro do traz consigo da própria história de origem. A construção e o aprendizado dos papéis sociais e das regras de relação é um processo circular de influência recíproca ao longo do tempo.
O casamento marca a saída dos cônjuges de suas respectivas famílias de origem, para constituir uma nova. Esse movimento se faz necessário para que o casal possa construir proximidade e intimidade, mas sem se perder no outro, sabendo, portanto, reconhecer quais são suas forças, fragilidades, alegrias, sofrimentos e conseguir exercitar a “separação dos pais”, o que possibilitará um novo senso de independência e autonomia e que, sistemicamente falando, todo ser está ad aeternum se casando e se separando da própria família de origem, porque tem a ver com o sentimento de “pertencimento”.
Legado Familiar
Muitas vezes escolhemos alguém para resolver uma série de necessidades existenciais, não satisfeitas em nossa família de origem, uma vez que não foi possível resolver os relacionamentos com nossos pais. Isso compromete nossa subjetivação e liberação para ir se vinculando e pertencendo a outros grupos e relações.
Carter e McGoldrick (1995) complementam discorrendo acerca dos padrões, legados, vazios não resolvidos e segredos das gerações anteriores (englobando, no mínimo, três gerações) que são capazes de construir e perpetuar “mitos”, que poderão interferir na escolha do cônjuge. Isto pode ocorrer, porque os parceiros trazem consigo seu pouco grau de diferenciação, geralmente determinado por mensagens internalizadas, desde muito cedo, em seu ciclo de vida familiar e que passa a fazer parte do seu padrão de interação - uma sequência de comportamentos inconscientes, automáticos, padronizados, repetitivos, que envolvem a comunicação analógica e digital.
Esse padrão de funcionamento é governado por regras de relação e é usado para responder e reagir às situações da vida e às situações relacionais, definindo quem, e o que, é permitido em cada subsistema, visando proteger a relação, de modo a manter o relacionamento.
Ciclo vital
O ciclo de vida individual e, posteriormente, do casal acontece dentro do ciclo de vida familiar. Em ambos os ciclos, haverá momentos críticos, de estresse e de crises, geradas por eventos esperados e impredizíveis. Esses acontecimentos costumam ocorrer nos pontos de transição de uma fase para outra, podendo haver rompimentos e não elaboração de temas como: lutos; tragédias e separação; que trazem implicações para a pessoa e para a relação como, por exemplo, o adoecimento (CARTER; MCGOLDRICK, 1995).
Conforme vamos crescendo e amadurecendo, vamos mudando o nosso jeito de estar no mundo, estar com o parceiro e com a família de origem. Assim, a relação passa a ser mais “fronteirizada”. Cada fase vem carregada de mudanças, que vão consolidando novas aquisições e adaptações necessárias , pois cada fase requer que passemos por atualizações, que façamos novos arranjos contratuais; ressignificações e uma reestruturação de nossas bases pessoais e do relacionamento com nossos pais, amigos, cônjuge e de tudo mais em nosso entorno, incluindo também o momento e o contexto histórico, social, econômico e político do lugar onde vivemos.
Marcelo Souza
Especialista em Terapia de casal e família pelo ITFSP - Instituto de Terapia Familiar de São Paulo
Sócio Titular da APTF - Associação Paulista de Terapia Familiar
E-mail: contato.psico.marcelo@gmail.com
Ao amor como motor e fio condutor sempre! :-)
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